Nasceu Leandro Cerezo, em Belo Horizonte, viveu em Milão, em Tóquio, em Miami e em Ibiza, e regressou este mês ao Brasil como Lea T, a modelo de 29 anos que está a dar que falar em todo o mundo. A brasileira fez a sua estreia em desfiles de moda em São Paulo menos de um ano depois de se expor numa campanha da Givenchy e de terem começado a chover os pedidos de entrevista. Afinal, não é todos os dias que uma transexual faz sucesso no mundo da moda. Leandro começou a dar lugar a Lea T. no dia em que o director criativo da Givenchy, Ricardo Tisci - na altura acabado de sair da Faculdade de Arte e Design Central Saint Martins, em Londres -, incentivou o amigo "muito feminino" a usar saltos altos numa festa. "Fomos comprar sapatos de drag queen e branqueámos as minhas sobrancelhas. Foi uma revelação", contou Lea T ao The Guardian. O "T" do seu novo nome é mesmo uma homenagem a Ricardo Tisci, que conheceu porque era amigo da sua companheira de casa. A feminilidade sempre foi uma problema para Lea T, que chegou a trabalhar como modelo masculino. Em muitos castings, quando entrava indicavam-lhe a sala para as provas femininas. Numa entrevista para um site de moda brasileiro, Lea recordou o dia em que conheceu o seu agente em Milão, Piero Piazzo. Lea T estava a passear com um amigo na praia, quando o agente se aproximou e perguntou quem era a rapariga.
O amigo contou-lhe que era um rapaz mas Piazzo disse que gostaria de o representar. Dez anos depois, Lea ligou-lhe: "Demoraste tempo, mas claro que vou ser teu agente", indicou-lhe então. Hoje são grandes amigos.Depois de já ter desistido do curso de Veterinária, Lea começou a trabalhar como assistente de Ricardo Tisci, na Givenchy. Como havia pouco dinheiro, era a amiga que fazia as provas das roupas e o estilista nunca pôs de lado a hipótese de ela fazer alguma campanha. A oportunidade acabou de surgir no ano passado. Apesar de tradicional, a marca percebeu que Lea T era o rosto andrógino que procuravam para representar a sua colecção. "Ela é uma verdadeira deusa", disse Tisci à ABC News. A brasileira aceitou, mas com uma condição: podia dizer abertamente que era transexual, dando assim voz a outros que enfrentam as mesmas dúvidas.
Filha do antigo futebolista brasileiro Toninho Cerezo (que esteve nos Mundiais de 1978 e 1982 e actualmente é treinador do Sport Recife), Lea T cresceu no seio de uma família muito religiosa e tradicional. "Todos viam que eu era diferente. Com o passar dos anos, toda a gente começou a rezar para que eu fosse gay. Teria sido menos mal para uma família religiosa", contou numa entrevista à Vanity Fair. A modelo diz, contudo, que a família a apoia na mudança de sexo, apesar de o tema não ser discutido abertamente. A operação final, de remoção dos órgãos sexuais, deverá acontecer ainda este ano.
Por enquanto, a modelo vai aproveitando os seus cinco minutos de fama. Depois de ter sido descoberta na campanha da Givenchy, Lea T fez uma polémica fotografia para a Vogue francesa e, já este mês, surge na capa da Love a beijar na boca a modelo britânica Kate Moss (ver caixas). Depois da estreia na semana da moda de São Paulo, em que foi uma das estrelas ao desfilar para o estilista Alexandre Herchcovitch, Lea T prepara-se para repetir o feito em Nova Iorque. E ainda em Fevereiro deverá ser convidada da famosa apresentadora norte-americana Oprah.
"Sou a mesma Lea e enfrento o mesmo preconceito", disse ao Estado de São Paulo. E, apesar dos amigos que tem, a mesma solidão. "Nós, os transexuais, nascemos e crescemos sozinhos. Após a operação, nascemos de novo, mas mais uma vez sozinhos. E morremos sozinhos. É o preço que pagamos", contou ao jornal The Guardian.
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