"Janis Joplin canta o blues com a potência de uma pessoa negra". Assim B.B. King certa vez classificou a cantora, morta no dia 4 de outubro de 1970, em Los Angeles, Califórnia. Mas a comparação da jovem texana com as potentes vozes do blues negro nunca foi novidade. Foi por meio de tal diferencial que Joplin chamou a atenção do selo Columbia Records no final da década de 1960, em contrato que levaria a artista a se tornar uma das principais influências da música dos últimos 50 anos.
Se estivesse viva, a garota nascida em uma pequena cidade interiorana do oeste norte-americano completaria 70 anos de idade neste sábado (19).
Nascida no dia 19 de janeiro de 1943 em Port Arthur, município com uma então população de cerca de 45 mil pessoas localizado no oeste do Texas, Joplin mostrou desde cedo vontade de se envolver com a música. No entanto, se o talento já era claro na infância, sua personalidade era completamente diferente daquela que a tornou mundialmente conhecida - festeira, subversiva, depressiva.
Joplin é descrita em suas biografias como uma criança sociável, boa aluna e bastante popular entre os colegas de escola. Ativa, começou a cantar nos primeiros anos de vida, no coral de uma igreja local. As mudanças de comportamento começaram a aparecer só no início da adolescência, por volta de 14 anos de idade, quando iniciou o ensino médio na Thomas Jefferson High School. Lá, conheceu o visual das meninas modernas da época, sempre arrumadas, com cabelos ajeitados e visual padronizado - e não gostou.
Repleta de espinhas no rosto, e bem distante dos padrões de beleza de suas colegas, adotou, então, um estilo pessoal: camisetas básicas, calças largas, madeixas desgrenhadas, rebeldes. Ganhou dos colegas o apelido de "porca", "assustadora", além da fama de ser promíscua.
A falta de afinidades com as meninas logo levou Joplin a se aproximar de rapazes, que compartilhavam com ela o gosto pela música, pelo blues, pelo jazz. Em 1961, com o ensino médio já completo, abandonou o curso na faculdade de tecnologia de Beaumont, a poucos quilômetros de sua cidade natal, e se mudou para Los Angeles, com o objetivo de deixar para longe a pequena e conservadora comunidade onde vivia.
Contudo, inicialmente a tentativa de deixar tudo para trás não deu certo - e Joplin retornou para perto de seus pais. Mas não por muito tempo. Em 1962, já em outro curso, na Universidade do Texas, localizada na capital do Estado, Austin, a cantora começou a se apresentar em uma casa noturna local, ao lado de um trio de amigos que atendia pelo nome Waller Creek Boys. E ganhou destaque por sua voz destoar tanto da das artistas brancas de destaque na época, como Joan Baez e Judy Collins, donas de vozes bem mais suaves.
"Janis era como um anjo que veio e pavimentou uma estrada na qual as garotas brancas ainda não haviam caminhado", descreveu a cantora Etta James, ícone da música negra, morta em 2011. "Passei a ter orgulho de ser uma influência para ela quando a ouvi cantar.
Reconheci instantaneamente isso. Entretanto, também ouvi uma eletricidade e uma raiva na sua voz. Amava sua atitude."
Simplesmente Janis
Por anos, Joplin tentou, sem sucesso. Foi para São Francisco em 1963, participou de alguns festivais e chegou a até se mudar para Nova York a fim de obter reconhecimento na música. Nada. Voltou para casa. Mas, três anos depois, tudo mudaria.
Em 1966, retornou a São Francisco para fazer um teste para integrar o grupo Big Brother, formado pelos músicos James Gurley, Dave Getz. Peter Albin e Sam Andrew. Logo gravou seu primeiro disco, em 1967, pela gravadora Mainstream: Big Brother and the Holding Company. O selo de não muita importância, no entanto, ofuscou a importância do trabalho. Mas isso também logo mudou.
Após se apresentar no festival de Monterey, Joplin chamou a atenção de Clive Davis, presidente da Columbia Records, que assinou com o grupo. Lançado em agosto de 1968, Cheap Thrills foi um sucesso quase instantâneo. Em outubro, ao longo de oito semanas consecutivas, o trabalho ficou na primeira colocação da Billboard, principal termômetro da indústria fonográfica norte-americana. Seu single Piece of My Heart também se tornou um incrível hit, um dos mais bem-sucedidos de 1968, vendendo quase um milhão de cópias nos EUA.
Apesar de ver os colegas de banda como uma segunda família, Joplin também os via como uma espécie de atraso para sua carreira. Em dezembro de 1968 tocou com o grupo pela última vez e partiu para um voo solo. Lançado em junho de 1969, I Got Dem Ol' Kozmic Blues Again Mama! manteve o sucesso do trabalho anterior, ganhando certificado de Disco de Platina (um milhão de cópias) apenas duas semanas depois de sua chegada às lojas.
No dia 16 de agosto de 1969, Joplin foi uma das principais atrações do lendário festival Woodstock, realizado na cidade de Bethel, no Estado de Nova York.
Clube dos 27
Insegura desde a adolescência, Joplin sempre mostrou gosto por bebidas e substâncias que alterassem sua consciência. Na época de faculdade, permanecia mais tempo em bares com colegas do que na sala de aula, segundo consta. O reconhecimento como artista atraiu formas mais caras e sofisticadas de sair da realidade e ela logo conheceu a maconha, o LSD e, finalmente, a heroína.
No dia 4 de outubro de 1970, meses depois de a cantora ter visitado o Brasil pela primeira e única vez, John Cook, um dos colegas de banda de Joplin, estranhou que ela havia faltado às suas sessões de gravação. O músico foi, então, ao hotel onde a artista estava hospedada e, após tentar insistentemente contatá-la pelo interfone, arrombou a porta do quarto, encontrando-a caída, ao lado da cama, com um maço de cigarros ainda à mão.
A morte foi consequência de uma overdose de heroína.
O corpo de Joplin foi cremado no Mortuario Pierce Brother Westwood Village e suas cinzas, jogadas na costa da Califórnia, perto da praia de Stinson. A morte veio apenas duas semanas depois do óbito de seu amigo Jimi Hendrix, que, assim como ela, morreu aos 27 anos.
Legado
"Tenho uma profunda conexão espiritual com Janis. Não sei como, por quê ou quando isso surgiu. Mas sempre estive extremamente atraída por sua energia, sua dor, sua voz e sua vida. Acho que ela é uma das mais incríveis mulheres que já viveram", classifica a estrela pop Pink.
Apesar de ter morrido em 1970, o grande sucesso de Joplin ainda estaria por vir. Em janeiro de 1971, menos de quatro meses após sua morte, a Columbia Records lançou Pearl, disco gravado por ela entre os meses de setembro e outubro do ano anterior, ao lado do grupo Full Tilt Boogie Band. O trabalho, certificado com Disco Quádruplo de Platina nos EUA (4 milhões de cópias), trouxe sucessos eternos como My Baby, Mercedes Benz e Cry Baby.
Para além da música, Yoko Ono, viúva de John Lennon, definiu Joplin da seguinte forma: "Janis tinha um sorriso quente, amigável, que é tão raro e, ainda assim, o distribuiu a todos da forma mais livre possível".
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