sábado, 25 de janeiro de 2014

'O Lobo de Wall Street' estreia criticado por glamorizar golpista

"Estão vendo essa caixa preta na frente de vocês? O nome disso é telefone. O que vocês têm que fazer é tirá-lo do gancho e repetir as palavras que ensinei. Isso vai deixá-los mais ricos que o mais poderoso CEO deste país." A instrução é dada a um grupo de corretores de ações —em sua maioria, novatos— por um febril Jordan Belfort, o tal "lobo de Wall Street", personagem real interpretado por Leonardo DiCaprio no novo filme de Martin Scorsese, que estreia hoje com cinco indicações ao Oscar (filme, diretor, ator, para DiCaprio, ator coadjuvante, para Jonah Hill, e roteiro adaptado).

O roteiro de "persuasão" criado por Belfort o fez faturar US$ 50 milhões por ano no início dos anos 1990, com sua corretora, a Stratton Oakmont. Como consequência, quebrou seus investidores em mais de US$ 200 milhões. Em 1998, foi condenado a quatro anos de prisão por fraude e lavagem de dinheiro —dos quais cumpriu 22 meses— e obrigado a pagar US$ 110 milhões às vítimas, dos quais apenas US$ 11,6 milhões foram quitados. Hoje ainda usa as técnicas como fonte de renda —mas de maneira "ética", frisa em seu site. Em letras grifadas em amarelo, avisa: "Cuidado! Nas mãos erradas, estas táticas de persuasão podem ser usadas para manipular seus clientes e as pessoas com quem você convive... E acredite, eu já passei por isso". O ex-corretor que hoje, aos 51, se define como o "maior treinador de vendas" do mundo, afirma que sua fórmula pode fazer qualquer empresa dobrar vendas em duas semanas. Os cursos custam até US$ 2.000 (R$ 4.770). Na hora de pagar, lê-se um recado que soa ironia pura: satisfação garantida ou seu dinheiro de volta em até 30 dias. "Não há risco", diz.

No filme, que tem por base os dois livros escritos por Belfort —"O Lobo de Wall Street" (2007) e "Catching the Wolf of Wall Street" (2009, sem tradução)—, o tom usado pelo personagem para passar segurança à sua presa é o mesmo, com a diferença de que podemos ver DiCaprio celebrando, de maneira obscena, mais um golpe. A decisão de filmar a história do trapaceiro revoltou quem sofre com as perdas causadas pela Stratton. "Vocês são perigosos. O filme é uma tentativa irresponsável de continuar fingindo que esse tipo de esquema é divertido", escreveu Christina McDowell, cujo pai, Tom Prousalis, era sócio de Belfort, numa carta ao diretor, a DiCaprio e ao próprio "lobo". Em três horas, o filme se centra na experiência de Belfort com drogas, prostitutas e ostentação —chegou a gastar US$ 700 mil em noitadas num hotel de Los Angeles. As cenas de sexo e drogas e o recorde de 569 repetições do palavrão "fuck" levaram, inclusive, o filme a ser censurado em países como Malásia, Índia e Líbano. O roteiro, porém, deixa de fora o drama dos ludibriados.

"A história real inclui milhares de vítimas que perderam centenas de milhões de dólares", criticou Joel M. Cohen, ex-promotor que ajudou na investigação do caso, em artigo no "New York Times". Para DiCaprio, que venceu o Globo de Ouro pelo papel, o filme pode ser "mal interpretado por alguns". "Mas espero que as pessoas entendam que não estamos sendo lenientes com esse comportamento; estamos condenando-o", disse à "Variety". Em seu site, porém, Belfort —que levou US$ 940,5 mil (R$ 2,2 milhões) pelos direitos de adaptação— elogia Scorsese por "não fazer julgamentos" no filme, que já arrecadou mais de US$ 80 milhões (R$ 189 milhões) nos EUA nas primeiras três semanas. "Para mim, é importante que as pessoas tirem a mensagem correta, que há coisas que fiz na vida que representam o melhor da humanidade: se construir a partir do nada, retornar do total fracasso, ir atrás dos seus sonhos."

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