Em sua curta e intensa passagem pelo Rio, Catherine Deneuve, 67 anos, disse que os brasileiros são caretas, criticou a banalização da informação, ficou apaixonada pelos irmãos Campana e desmitificou o título de diva. "É pejorativo, parece coisa de alguém cheio de vontades", disse, em entrevista para divulgação do filme Potiche: Esposa Troféu, de François Ozon, como parte do Festival Varilux de Cinema.
Numa calça de veludo roxa e cardigã verde - na tendência blocking color - ela foi simpática quando chegou depois de duas horas de espera - o voo de São Paulo atrasou por conta do mau tempo - e arriscou um "bom dia" em português carregado. Aparentemente, o cotidiano da atriz não tem nada de diva e fez questão de dizer que não vive como a Catherine Deneuve e sim como a Catherine. "Às vezes, é um pouco pesado ser Deneuve, mas há mais vantagens do que desvantagens. Moro num bairro em que as pessoas estão acostumadas comigo. Não vou à Champs-Elysées (avenida badalada de Paris), claro, fico em Saint-Germain, que é um bairro mais boêmio. O culto às celebridades tomou uma proporção tão grande que as pessoas olham para imagens que não tem menor importância, banalizou muito. Na França menos, mas mesmo lá", reclamou.
"As pessoas aceitam coisas que não aceitavam antes, como fazer fotos na sua cozinha, na sala, no jardim. Se eu quero saber sobre uma atriz, vejo o filme e avalio o seu trabalho. O que faz falta ao cinema é o mistério. Não quero saber se os atores vão à feira, levam os filhos à escola ou jantam em tal restaurante", disparou sobre o assunto exaustivamente comentado quando fumou dois cigarros durante a coletiva em SP. "Estou aqui para falar de Potiche e não para parecer uma fumante compulsiva. Sou contra o politicamente correto. Fiz uma viagem longuíssima para falar do filme e o que vai ficar é 'ih, ela fumou'. Francamente!".
Assim que saiu da saleta de entrevistas - depois de 40 minutos - foi direto para a varanda do hotel, onde acendeu um Gauloise - marca popular na França - atrás do outro, tomou café, comeu um muffin e, vaidosa ao extremo, não largou do espelhinho para corrigir e dar um up na maquiagem e no cabelo, sempre impecáveis. A diva - mesmo tentando, não tem como escapar do título -, que trabalhou com diretores como Roman Polanski, Lars von Trier, François Truffaut, Claude Lelouch e Mario Monicelli, revelou um nome com quem gostaria de atuar. "Sei que sou francesa e tenho pouca chance de fazer um filme anglo-saxão ou americano. Um diretor que admiro muito, com quem adoraria fazer um filme, é o (Francis Ford) Coppola", avisou. Perguntada sobre o que achava sobre mulheres no poder, Deneuve retrucou: "Você que tem que me dizer como é, já que vocês têm uma presidente", para risos gerais. Em São Paulo, ela visitou o ateliê dos irmãos Campana ("foi uma das coisas mais maravilhosas que já vi na vida"), o MAM, comprou o livro dos designers de móveis e dois jacarés do artista Arqueiro, na loja do museu. A francesa também fez críticas a Hollywood: "Acho lamentável o culto à beleza e à juventude, porque é muito limitador. É mais fácil envelhecer na Europa que nos Estados Unidos. É claro que, aos 67 anos, não posso mais fazer papéis de menina. Eles vão mudando conforme a idade, mas também deixam muitas possibilidades em aberto. O importante é estar bem consigo mesma". A coluna relembrou sua atuação em Fome de Viver, de Tony Schott, ao lado de David Bowie e Susan Sarandon, em 1983, em que ela interpretou uma vampira que consegue se manter viva e bela através dos séculos com o sangue dos seus amantes. "Sempre amei histórias de vampiros. Achei o máximo e foi extremamente sensual, misterioso e me deu muito prazer". Ela concorda que os filmes de vampiro que estão em alta hoje em dia são politicamente corretos. "É uma vertente que tem interesse para algumas pessoas". Deneuve voltou à suíte presidencial do Sofitel, descansou pouquíssimo e, às nove da noite, estava linda num macacão de seda preto e echarpe rosa na porta do cinema Odeon, ao lado de toda a francesada que esteve na cidade para a abertura do festival, como Audrey Tautou - a eterna Amélie Poulain, que de perto parece uma adolescente de 14 anos de tão pequenina -, Aure Atika, Yahima Torres, Caroline Bottaro, Nicolas Vanier e Philippe Martin. Quando Deneuve subiu ao palco para agradecer, a plateia ficou de pé, aplaudindo efusivamente. O filme começou e foi a deixa para a atriz partir com a equipe para um jantar armado no Parque Lage, e ainda teve fôlego para dar um pulinho na festa preparada para a turma no Palácio da Cidade, em Botafogo. Mas, pela superlotação do lugar e assédio sem controle, os "astros da noite" não demoraram e saíram rapidinho do "pagode no palácio". Para receber os franceses, a produção do festival colocou um trio cantando samba e chorinho.
O Dia
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