O que era para ser uma discussão comum no ambiente escolar tem evoluído para casos de polícia no País. Só em Porto Alegre (RS), pelo menos seis situações envolvendo professores e alunos foram registradas em delegacia nos últimos três meses, de acordo com a Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul. E a falta de tolerância em sala de aula não se restringe a docentes e estudantes. Segundo a psicóloga Luiza Elena do Valle, autora do livro Violência e Educação, pais e instituições de ensino estão se tornando verdadeiros inimigos. De acordo com Luiza, que também é mestre em psicologia da educação, um componente que ajuda a entender as dificuldades nas relações entre alunos e professores é que os educadores estão sofrendo de uma "irritação aguda", reflexo dos tempos atuais, e que pode levá-los a ultrapassar a linha do respeito com a turma. "Há excesso de pressão no trabalho, em diversos aspectos, que provocam imensa ansiedade e tensão", diz.
Professor chama a atenção de aluna e vai para a delegacia
Professor há mais de 10 anos, Maurício Girardi teve de se explicar na 8ª delegacia de Polícia da capital gaúcha. O servidor público, que leciona física na Escola Estadual Piratini, se diz "humilhado" por ter de responder formalmente por constrangimento ilegal, crime que teria provocado dentro da sala de aula.
A acusação partiu de uma aluna de 17 anos, matriculada no período na noite. A preocupação com o comportamento da garota já havia começado no início do ano letivo, segundo ele. "Ela evadia muito, o tempo inteiro. É o que chamo de turista, vinha só de vez em quando para a escola", conta o professor.
No dia 21 de junho deste ano, a adolescente apareceu na aula de física depois de meses ausente. "Por três vezes tive de pedir licença para poder explicar o conteúdo que abordávamos. Ela estava fazendo 'social' em plena aula", conta o professor. Mesmo depois de três pedidos, Girardi afirma que a estudante continuou com a conversa. "O estopim foi quando o telefone celular dela tocou. Então disse que ela deveria ficar em casa se não quisesse estudar". O professor conta que a aluna se sentiu ofendida e saiu da sala chorando. No dia seguinte, segundo Girardi, os pais da estudante ligaram para a escola afirmando que "conheciam gente influente na cidade e que aquilo não iria ficar assim". A ameaça da família se transformou em uma acusação formal na Polícia Civil. Um mês depois do ocorrido, Girardi foi convocado a prestar esclarecimentos na delegacia.
Na ocorrência policial, a estudante alegou que o educando a destratou na frente dos colegas e a expulsou da instituição do ensino. Ela ainda afirmou que se sentiu constrangida e humilhada na frente dos outros alunos. Por meio da escola, a família da adolescente afirmou que prefere não falar sobre o assunto.
Para o professor, o caso é um retrato da realidade no sistema de ensino: "Alunos sem limite e pais que alimentam esse desrespeito. Em nenhum momento a mãe dessa aluna foi à escola para escutar a minha versão da história", diz. "Resolvi ser professor porque sempre gostei de ensinar e de ver alguém se apropriar do conhecimento e crescer. Mas está cada vez mais difícil. Sinceramente, acho que é mais um professor que o Estado perde", desabafa Girardi.
Escola apoia o professor
A Direção da Escola Estadual Piratini se posiciona a favor do professor e afirma que "ele não possui nenhum antecedente de problemas em ambiente escolar". Segundo o vice-diretor do turno da noite, Antônio Carlos Niemezewski, Girardi "é muito querido pelos alunos e nunca tinha recebido nenhuma reclamação por parte dos estudantes quanto ao seu comportamento". "Quando o fato aconteceu, chamei a mãe da aluna para conversar e pedi para resolvermos a situação internamente. Ela não quis escutar a versão do professor e nem mesmo resolver o ocorrido na direção da escola", conta Niemezewski, que diz ainda ter aconselhado a mãe da adolescente e procurar a Secretaria de Educação. "Falei para ela resolver isso com uma instituição de ensino, com a Secretaria, mas ela preferiu levar para a polícia", lamenta.
"A escola chama os pais para reclamações, e os pais criticam diretores e professores. Se o professor perde os próprios limites, ele deixa de prestar a função educativa que é esperada dele. Escola e família deveriam atuar em conjunto e em benefício do aluno. Em vez de procurar culpados, deveriam cooperar entre si", pondera a psicóloga Luiza Elena do Valle. Aguardando a tramitação do caso no Fórum Regional, Girardi responde por constrangimento ilegal, que é definido pelo Direito Penal brasileiro como um crime contra a liberdade individual que está no ato de constranger mediante violência ou ameaça. Segundo Andrei Zenkner Schmidt, advogado especialista em direito penal, a pena pode ser detenção de três meses a um ano ou multa, fixada pelo juiz de acordo com circunstâncias. O valor pode chegar a cinco salários mínimos. Schmidt afirma que o professor ainda pode ser expulso da instituição de ensino em que atua. "Mas não há obrigação legal de expulsá-lo", completa. Girardi segue lecionando na Escola Piratini, onde a menina ainda está matriculada, mas não comparece mais às aulas de física ministradas por ele.
Discussões são constantes em sala de aula
Através de um estudo de caso, os acadêmicos de Direito do Centro Universitário Luterano de Ji-Paraná (Ulbrajp) Evaldo Inácio Delgado e Jenaldo Araujo Alvez detectaram que situações de violência verbal têm presença constante na sala de aula. A partir da observação das relações aluno-professor, a dupla concluiu que educadores e educandos apresentam mais incompatibilidades do que convergências, e que o ato do constrangimento ilegal ocorreria de ambos os lados. Entretanto, o estudo comprovou que, diferentemente do caso gaúcho, são poucas as situações que acabam nos tribunais. A maioria dos desentendimentos é resolvida na direção da escola. Mas, segundo os mestrandos, se os envolvidos tivessem conhecimento de que tais situações configuram crime, provavelmente o número de casos na Justiça seria maior.
Professor chama a atenção de aluna e vai para a delegacia
Professor há mais de 10 anos, Maurício Girardi teve de se explicar na 8ª delegacia de Polícia da capital gaúcha. O servidor público, que leciona física na Escola Estadual Piratini, se diz "humilhado" por ter de responder formalmente por constrangimento ilegal, crime que teria provocado dentro da sala de aula.
A acusação partiu de uma aluna de 17 anos, matriculada no período na noite. A preocupação com o comportamento da garota já havia começado no início do ano letivo, segundo ele. "Ela evadia muito, o tempo inteiro. É o que chamo de turista, vinha só de vez em quando para a escola", conta o professor.
No dia 21 de junho deste ano, a adolescente apareceu na aula de física depois de meses ausente. "Por três vezes tive de pedir licença para poder explicar o conteúdo que abordávamos. Ela estava fazendo 'social' em plena aula", conta o professor. Mesmo depois de três pedidos, Girardi afirma que a estudante continuou com a conversa. "O estopim foi quando o telefone celular dela tocou. Então disse que ela deveria ficar em casa se não quisesse estudar". O professor conta que a aluna se sentiu ofendida e saiu da sala chorando. No dia seguinte, segundo Girardi, os pais da estudante ligaram para a escola afirmando que "conheciam gente influente na cidade e que aquilo não iria ficar assim". A ameaça da família se transformou em uma acusação formal na Polícia Civil. Um mês depois do ocorrido, Girardi foi convocado a prestar esclarecimentos na delegacia.
Na ocorrência policial, a estudante alegou que o educando a destratou na frente dos colegas e a expulsou da instituição do ensino. Ela ainda afirmou que se sentiu constrangida e humilhada na frente dos outros alunos. Por meio da escola, a família da adolescente afirmou que prefere não falar sobre o assunto.
Para o professor, o caso é um retrato da realidade no sistema de ensino: "Alunos sem limite e pais que alimentam esse desrespeito. Em nenhum momento a mãe dessa aluna foi à escola para escutar a minha versão da história", diz. "Resolvi ser professor porque sempre gostei de ensinar e de ver alguém se apropriar do conhecimento e crescer. Mas está cada vez mais difícil. Sinceramente, acho que é mais um professor que o Estado perde", desabafa Girardi.
Escola apoia o professor
A Direção da Escola Estadual Piratini se posiciona a favor do professor e afirma que "ele não possui nenhum antecedente de problemas em ambiente escolar". Segundo o vice-diretor do turno da noite, Antônio Carlos Niemezewski, Girardi "é muito querido pelos alunos e nunca tinha recebido nenhuma reclamação por parte dos estudantes quanto ao seu comportamento". "Quando o fato aconteceu, chamei a mãe da aluna para conversar e pedi para resolvermos a situação internamente. Ela não quis escutar a versão do professor e nem mesmo resolver o ocorrido na direção da escola", conta Niemezewski, que diz ainda ter aconselhado a mãe da adolescente e procurar a Secretaria de Educação. "Falei para ela resolver isso com uma instituição de ensino, com a Secretaria, mas ela preferiu levar para a polícia", lamenta.
"A escola chama os pais para reclamações, e os pais criticam diretores e professores. Se o professor perde os próprios limites, ele deixa de prestar a função educativa que é esperada dele. Escola e família deveriam atuar em conjunto e em benefício do aluno. Em vez de procurar culpados, deveriam cooperar entre si", pondera a psicóloga Luiza Elena do Valle. Aguardando a tramitação do caso no Fórum Regional, Girardi responde por constrangimento ilegal, que é definido pelo Direito Penal brasileiro como um crime contra a liberdade individual que está no ato de constranger mediante violência ou ameaça. Segundo Andrei Zenkner Schmidt, advogado especialista em direito penal, a pena pode ser detenção de três meses a um ano ou multa, fixada pelo juiz de acordo com circunstâncias. O valor pode chegar a cinco salários mínimos. Schmidt afirma que o professor ainda pode ser expulso da instituição de ensino em que atua. "Mas não há obrigação legal de expulsá-lo", completa. Girardi segue lecionando na Escola Piratini, onde a menina ainda está matriculada, mas não comparece mais às aulas de física ministradas por ele.
Discussões são constantes em sala de aula
Através de um estudo de caso, os acadêmicos de Direito do Centro Universitário Luterano de Ji-Paraná (Ulbrajp) Evaldo Inácio Delgado e Jenaldo Araujo Alvez detectaram que situações de violência verbal têm presença constante na sala de aula. A partir da observação das relações aluno-professor, a dupla concluiu que educadores e educandos apresentam mais incompatibilidades do que convergências, e que o ato do constrangimento ilegal ocorreria de ambos os lados. Entretanto, o estudo comprovou que, diferentemente do caso gaúcho, são poucas as situações que acabam nos tribunais. A maioria dos desentendimentos é resolvida na direção da escola. Mas, segundo os mestrandos, se os envolvidos tivessem conhecimento de que tais situações configuram crime, provavelmente o número de casos na Justiça seria maior.
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