Mauricio Stycer
Lembrando
que o “Jornal Nacional” dedicou dez minutos para falar do parto de
Sasha, chega a ser curto o tempo (25 minutos) oferecido a Xuxa no
“Fantástico” para fazer revelações surpreendentes sobre a sua vida,
entre as quais a oferta que recebeu para se casar com Michael Jackson e a
confissão de que sofreu seguidos abusos sexuais na infância.
O relato sobre a proposta que teria recebido do empresário de Jackson
é especialmente curioso. Xuxa foi muitas vezes comparada ao cantor
americano por conta da estanha imagem que construiu, de uma vida sem
amigos nem amores, protegida em uma “bolha”, isolada do mundo real.
A entrevista ao “Fantástico”, como tantas situações protagonizadas
por Xuxa, foi um evento “controlado”, ao longo do qual ela foi senhora
da situação. Disse apenas o que quis, da forma que achou melhor. Isso
incluiu, por exemplo, o fato de falar de Adriane Galisteu sem que o nome
ou a imagem da “rival” aparecesse na edição ou, ainda, o fato de não
mencionar o pai de sua filha.
Ao conhecer Senna e se encantar pelo piloto, Xuxa revelou ter
pensado: “Um cara com grana que não vai querer a minha”. Este mesmo
pragmatismo aparece ao longo de quase todo o depoimento dado a Claudio
Manoel.
Séria,
sem emoção maior, com o texto na ponta da língua, falou da infância em
Bento Ribeiro, do começo na Bloch, do seu namoro de seis anos com Pelé e
da descoberta de que Senna era sua “alma gêmea”.Já ao descrever a sua atual carência afetiva e sexual, riu como se
fosse uma criança. “Os hormônios”, exclamou, sem saber se reclamava ou
festejava do fato de sentir desejo.Por fim, veio a parte barra pesada do depoimento. “Eu fui abusada”,
ela disse, com todas as letras. “Não foi uma pessoa, foram algumas
pessoas que fizeram isso”, continuou, antes de citar “o melhor amigo” do
pai, “o cara que ia casar com a minha avó” e um professor da escola
como autores de abusos que sofreu.
Para
além das inquietações de caráter psicológico que este depoimento
suscita, não é possível ver a participação de Xuxa no “Fantástico” sem
deixar de pensar na guerra da audiência em que o dominical da Globo está
envolvido e na pouca empolgação que o programa da própria apresentadora
suscita nos dias de hoje.Por que revelar em rede nacional um trauma desta gravidade? Xuxa está
engajada numa campanha contra o abuso de crianças e pode ter pensado
que o seu depoimento ajudaria a tornar o tema menos tabu. É provável que
isso até ocorra, mas acho que há formas e formas de fazer campanhas
educativas.
O depoimento de Xuxa, creio, faz pensar basicamente sobre Xuxa.
Transforma todos os espectadores em psicólogos de botequim. Somos
obrigados, de uma hora para outra, a voltar a especular sobre a vida e a
carreira da “rainha dos baixinhos” e sobre o seu comportamento em
diferentes situações. O que é muito triste, enfim.
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