Para Carlos Alberto Carvalho Filho ser gago não significa fragilidade nem insegurança
Carlos Alberto Carvalho Filho, gago, especialista em negociações e vendas, conversou com o iG Carreiras e deu sua opinião sobre o assunto. Autor do livro “Você É o Cara” (Integrare Editora, 2011), Carvalho discute na sua obra temas relacionados à satisfação profissional e pessoal de cada um.O que você sugere para uma pessoa com gagueira?

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Autor do livro "Você é o Cara", Carlos Alberto Carvalho Filho afirma que a autoconsciência é o principal tratamento para a gagueira
Carlos Alberto Carvalho Filho: A autoconsciência de que é gaga. Não pode esconder que você é gago. Quanto mais você se deprecia por isso, mas dificuldade terá.
A partir do momento que eu assumi essa condição, fiquei com uma nova forma de comunicação. A minha gagueira passou a ser minimizada. Hoje eu gosto de ser gago. Criei uma identidade. Virou uma vantagem competitiva. Esse é o segredo que eu passo para as pessoas que têm dificuldade. Construir algo em cima do seu problema para ele se tornar uma vantagem. Comecei dar palestras em 2004 e a mídia começou a me procurar por isso. Será que se eu não fosse gago, com um ano de palestrante as revistas iriam me chamar?
Não conheço ninguém que tenha deixado de ser gago. O que pode ser feito é minimizar a gagueira com algumas técnicas para administrá-la: falar com gestos, usar sinônimos de palavras para fazer alguma substituição e falar pausadamente. Mas o fundamental é quando a pessoa se torna maior que a gagueira e a enfrenta.
iG: Qual a dificuldade de um gago no mercado de trabalho?
CACF: Eu, mesmo gago, com 22 anos fui para uma multinacional trabalhar com vendas. Não enfrentei dificuldades. Mas é óbvio que muitas pessoas ainda têm um desconhecimento, porque associam a gagueira a uma pessoa mais frágil, insegurança. E não é assim. Pelo contrário, em cima disso é que se nota a personalidade da pessoa, como ela enfrenta o problema.
Pensar que ser gago atrapalha o trabalho é uma mentalidade muito antiga. Hoje, acho que há gagos que enfrentam determinadas situações melhor que muitas pessoas fluentes. São muito mais seguras do que outras.
Eu fiquei gago com 5 anos, devido a um sequestro que eu sofri. Aquele trauma gerou a minha gagueira. Mas talvez se não fosse o sequestro seria outra coisa. Eu tenho esse gene comigo. Meu avó era gago, há outras pessoas na minha família que também são.
iG: Qual a impressão que um gago passa? Que tipo de preconceitos ele sofre?
CACF: Mentes menos esclarecidas têm preconceito. Os gagos enfrentam muito bullying na escola. O diferente é sempre visto como engraçado. Comigo, a partir do momento que assumi a minha condição, não sofri nenhum tipo de preconceito. O problema maior era comigo, de baixa autoestima. As pessoas não têm tanto preconceito. Isso é muito mais do próprio gago.
iG: A gagueira leva a outros problemas emocionais?
CACF: Se não é bem administrada, pode levar ao pior dos problemas emocionais que é baixa autoestima e, por consequência, a depressão. Se a pessoa se sente menor por ser gago, ela vai se fechar e deixar de se relacionar. Isso sim pode gerar problemas maiores.
No filme “Discurso do Rei”, o personagem precisa mostrar segurança para seu povo. Como um gago demonstra isso?

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Indicado ao Oscar 2011, "Discurso do Rei" mostra como a gagueira pode influenciar a vida de alguém
CACF: Todo mundo tem um momento que fica ansioso e gagueja. O gago tem essa grande vantagem. Ele pode gaguejar sempre e ninguém acha que está nervoso. No filme, quanto mais ele se revoltava com o fato de ser gago, mais ele ficava. Quando ele relaxava, ele melhorava. Tem uma cena do filme que ele conta histórias para suas filhas e ali ele não gagueja nada. Naquele momento ele não precisa mostrar nada para ninguém, não está sendo questionado e, por isso, está mais tranquilo. Já quando ele tem que assumir uma posição de ter que falar e de se expor, ele gagueja mais. É uma carga emocional.
Quando ele vai fazer o discurso, você nota a tensão. Depois que ele fala e se sai bem, há um grande relaxamento e a fala dele já sai bem melhor. O simples fato de ter uma sensação de êxito modifica sua gagueira. Por isso, a “cura” passa muito mais pela condição de autoestima do que um tratamento médico. A autovalorização faz toda diferença.
iG: O filme é um bom exemplo dos problemas que os gagos enfrentam?
CACF: Sim, o filme mostra que é possível enfrentar e vencer momentos. Tem uma grande cena que é quando ele encerra um discurso muito bem e a sua filha diz que ele gaguejou em uma determinada palavra. E ele diz que teve que gaguejar para que as pessoas vissem que era ele que estava falando. Nessa hora, o filme mostra a segurança dele.
iG: Falando de você, a gagueira atrapalhou sua vida?
CACF: Acho que sim. Na minha fase inicial, na adolescência, a gagueira me atrapalhou, pois acabou me levando a fazer o curso de Engenharia que não tinha nada a ver com o que eu queria. Escolhi porque assim não precisaria falar muito. Mas a minha vocação sempre foi para Ciências Humanas. Quando eu decidi largar e ir para a área de vendas, tudo começou a melhorar. Eu nasci para viver na pluralidade das pessoas e não na singularidade dos números.
iG: Pode dar uma breve do livro “Você É o Cara”?
CACF: É um livro comportamental. Enfoca claramente como podemos descobrir nossos dons e talentos. Como transformar nossos talentos em pontos fortes por meio de conhecimento, habilidade e atitude. E como podemos transformar esses pontos fortes em diferenciais, por meio de visão, disciplina, consciência e paixão.
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