sábado, 19 de maio de 2012

Álbum 'Transa', de Caetano Veloso, é reeditado aos 40

MARCUS PRETO
DE SÃO PAULO
Logo que conheceu Ralph Mace, o inglês que produziria seus dois álbuns no exílio londrino (1969-1972), Caetano Veloso foi levado por ele a conhecer David Bowie.
Tecladista em "The Man Who Sould the World" (1970), um dos maiores clássicos de Bowie e do glam rock, o produtor imaginava que os dois poderiam trabalhar juntos.
"Ele me levou num show de Bowie na Round House", lembra hoje Caetano. "Mas eu não gostei muito."Abortada a ideia de parceria com Bowie, Mace foi cuidar dos trabalhos individuais de Caetano e de Gilberto Gil.Gil fez só um LP em inglês: "Gilberto Gil" (1971). Caetano fez dois: "Caetano Veloso" (1971), do hino de exílio "London, London", e "Transa", nunca editado por lá. Só sairia no Brasil quando Caetano já estava de volta, em 1972."Transa" completa 40 anos e ganha neste mês novas edições em CD (remasterizado no estúdio da Abbey Road) e vinil com o projeto gráfico original de Álvaro Guimarães, batizado de "Discobjeto"
Desde meados dos anos 1990, "Transa" ganhou o status de "o melhor disco de Caetano" por parte da nova geração de músicos brasileiros. E também pelo público.Neste ano, inventaram até um abaixo-assinado na internet: "Queremos 'Transa' do Caetano ao vivo". Mas o cantor não pretende remontar o show, já que não poderia ter a banda original no palco.
"Se [o baixista] Moacyr Albuquerque estivesse vivo, eu pensaria em fazer", diz. "Era um caso especial: funcionávamos como uma banda."

Divulgação
O cantor e compositor Caetano Veloso exilado em Londres, em 1972
O cantor e compositor Caetano Veloso exilado em Londres, em 1972
E a banda contava ainda com as baterias e percussões de Áureo de Souza e Tutty Moreno e as guitarras e os violões de Jards Macalé.
"A gente começou a ensaiar em um parque durante a primavera. Fizemos um piquenique e começamos a tocar", lembra Macalé, que também assinou a produção musical. "Os arranjos eram coletivos. Caetano dava algumas ideias e cada um colocava sua parte do arranjo. Eu só dava uma limpeza final."Em uma de suas visitas aos amigos exilados, Gal Costa participou fazendo vocais.
"Foi coisa rápida. Mas era muito simbólico eu estar ali, fazendo companhia para eles naquele momento", diz Gal.Também está creditada na nova edição de "Transa" a participação da cantora Ângela RoRo tocando flauta."Ângela chegou apresentada por Glauber Rocha, que dizia que ela já era uma artista pronta", diz Caetano. "A gente achou mesmo que ela era especial. Muito jovem, muito musical e com muita personalidade. Estava sempre lá em casa ou na de Gil. Ela tocou gaita -e não flauta- na faixa 'Nostalgia'. Coisa de que me orgulho muito."Segundo Tutty, o empresário dos tropicalistas, Guilherme Araújo, comandava tudo."Eu me lembro que o produtor inglês [Mace] queria um disco diferente, mais agressivo musicalmente", diz. "Mas Guilherme fez muitas reuniões com ele até convencê-lo que já estava bonito."Caetano diz não se lembrar de nada nesse sentido.
"Voltei ao Brasil, e Mace ficou muito chateado comigo. Ele me pediu que eu ficasse mais um ano lá, já que 'Transa' era um disco bonito e o show que fizemos no Queen Elizabeth Hall tinha sido excelente", diz Caetano.E segue: "Ele achava que naquele momento estava começando uma espécie de sucesso, como ele previa para mim. Mas preferi voltar ao Brasil. Ele ficou de mal. O disco foi lançado no Brasil pela Philips. Nunca em Londres".

"Talvez 'Livro' seja melhor do que 'Transa'", diz Caetano Veloso


CAETANO VELOSO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Tem horas em que vejo a reação de sucessivas gerações de jovens brasileiros se parecerem com a plateia do programa "Som Livre Exportação", da TV Globo, quando vim ao Brasil, numa concessão dos milicos, para o aniversário de casamento dos meus pais, em 1971.
Era uma garotada que esperava que eu fizesse um rock moderno e ficou frustrada ao me ouvir cantar "Adeus Batucada" só com o violão.
Cantar aquele samba que era uma profecia do exílio de Carmen Miranda, feita pelo compositor Sinval Silva, tocando meu violão para o grande público pela primeira vez no Brasil, era o que havia de menos careta.Mas os garotos que esperavam algo progressivo (que eu já achava careta) ficaram decepcionados. Caretice para eles era isso.Depois que fui a Nova York, em 1983, comecei a achar que devia tomar certa responsabilidade pelo que os gringos ouviam de mim: artistas e críticos mostraram grande interesse no que eu fazia. Antes disso, não.Sou brasileiro velho. Do tempo em que a gente não acreditava na realidade do mundo exterior.
"Transa", para mim, é um dos meus melhores álbuns. Talvez "Livro" (1997) seja melhor. Talvez "Cê" (2006). Antigamente, eu achava "Jóia" (1975) -queria achar. Mas isso era um pouco careta.

Daniel Marenco-28.fev.2012/Folhapress
Caetano Veloso no prêmio Anu 2012
Caetano Veloso no prêmio Anu 2012

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