Com apenas 15 anos, o estudante de Santo Ângelo (RS) denunciou agressão sofrida na escola
Foto: Angela Chagas/Terra
Foto: Angela Chagas/Terra
"Se eu não tivesse denunciado o que fizeram comigo, meu caso iria
acabar como mais uma estatística da violência contra os gays no Brasil",
é assim que o estudante C.T., de apenas 15 anos, resume o drama vivido
em uma escola pública de Santo Ângelo, no interior do Rio Grande do Sul.
Em um e-mail enviado à Associação Brasileira de Lésbicas, Gays,
Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) poucos dias depois de ser
agredido por um colega de aula, ele contou que sentia vontade de morrer.
"Às vezes eu sinto que ninguém gosta de mim e que a única solução é me
matar", escreveu na mensagem que foi divulgada em todo o País.
Dois meses depois de ser agredido com chutes e pontapés pelo colega de aula, o adolescente disse que enviou o e-mail como uma forma desesperada de romper com o silêncio comum às vítimas da homofobia em busca de respeito. C.T. e sua mãe, que preferiu não divulgar o nome para preservar o filho, receberam o Terra em sua casa, na cidade de Santo Ângelo, localizada a 450 km de Porto Alegre. Pedagoga, a mãe disse que ela e o marido levaram um choque quando souberam que o adolescente havia sido agredido na escola.
"Foi um grande susto, mas desde o primeiro momento decidimos apoiar o nosso filho", contou a mulher ao afirmar que não sabia que o adolescente sofria bullying dos colegas. "A parte física não foi tão forte, foram alguns chutes e socos. Isso passou. Mas o pior foi o lado emocional. Ele tem pesadelos quase todas as noites e agora precisa de acompanhamento psicológico", disse sobre o único filho.
A família de C.T. registrou um boletim de ocorrência na Polícia Civil após a agressão. O colega de aula, da mesma idade, foi ouvido, assim como educadores da escola, que foram acusados de omissão. "Os professores sabiam o que acontecia comigo e tapavam os olhos. Vários colegas faziam piadinha comigo e eles não faziam nada", disse o estudante. "Normalmente, os professores não querem se envolver, não pensam que é algo sério. Acham que é só uma brincadeira de adolescente. Mas no meu caso, o resultado dessas 'brincadeiras' foi a agressão. O meu colega começou a me bater na saída da aula e disse que tinha uma faca para me matar. Tinha um monte de gente em volta olhando, e ninguém fez nada".Segundo a responsável pela Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente de Santo Ângelo, Elaine Maria da Silva, a investigação foi concluída em abril e encaminhada ao Ministério Público. A delegada disse que o resultado não pode ser divulgado por envolver menores de idade. Para C.T., a sensação é de impunidade: "Todo mundo sabe quem eu sou nessa cidade, apesar de ter pessoas que me apoiam, muita gente passa por mim e me reprova. A minha vida mudou muito, tenho medo de sair na rua e ser agredido de novo. Para ele (o agressor), a vida continua a mesma, ou até melhor porque ele foi tratado como herói. Uma prova disso é que semanas depois da agressão ele foi eleito líder da turma", lamenta o adolescente, que estudava no 1º ano do ensino médio na Escola Estadual Onofre Pires.Além do medo, ele precisou enfrentar várias mudanças após denunciar a agressão. A família o matriculou em uma escola particular da cidade. Ele também recebe acompanhamento de duas psicólogas: uma do novo colégio e outra contratada pela Secretaria de Educação do Estado. Apesar do sofrimento, C.T. não se arrepende em ter tornado pública sua história. "Fiz isso como uma garantia para que meu caso não fosse negligenciado".
A direção da escola Onofre Pires, onde ocorreu a agressão, disse que o caso está sob responsabilidade do Ministério Público e que não vai comentar as denúncias do aluno. Já a Secretaria Estadual da Educação informou que presta toda a assistência ao jovem e a sua família, com o acompanhamento da psicóloga.
A atitude desse menino é uma exceção, diz pesquisadora
Coordenadora da Área de Juventude e Políticas Públicas da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais, Miriam Abramovay afirma que a história de C.T. é uma exceção no Brasil. "Ele é uma exceção porque reagiu. Foi para os jornais, falou com os governos, com os movimentos sociais. Isso tudo é fruto de uma consciência política muito forte. A maioria dos adolescentes que passa pela mesma situação acaba silenciando. O medo e a vergonha de se sentir culpado por ser diferente faz com que não reajam à violência", explica Abramovay, autora de diversos livros e pesquisadora sobre a violência nas escolas.Segundo ela, a falta de reação contra o bullying homofóbico causa diversos danos, como o isolamento social, falta de interesse nos estudos e, em alguns casos mais extremos, leva até ao suicídio. "A escola trabalha na lei do silêncio, e não do diálogo. Quanto menos tiver que fazer melhor. Acontecem 800 casos iguais por dia, mas a escola finge que não é nada sério", lamenta a especialista. Ela afirma ainda que os educadores estão despreparados para lidar com a sexualidade e diversidade de gênero e que a falta de uma política pública voltada para discutir a homofobia dentro das escolas impede avanços. "Temos que colocar mais energia nisso. Já existem algumas ações isoladas, mas ainda é algo muito tímido, que precisa ser reforçado", afirma ao destacar a importância da capacitação dos professores para lidar com a violência homofóbica.Para C.T., que sonha em ir para uma cidade maior estudar medicina ou jornalismo, as escolas públicas ainda não estão preparadas para lidar com a homofobia. "Na minha escola nova, que é particular, eu percebo que os professores são mais capacitados, não tem tanto preconceito. Mas no geral, acho que falta muita informação. Eu acredito muito que o preconceito acaba quando as pessoas conhecem o assunto. Elas deixam de acreditar em crendices, passam a perceber que os gays são pessoas iguais a todas as outras", disse ao Terra.
C.T. finalizou citando o kit de combate a homofobia que seria distribuído nas escolas públicas e que foi vetado pela presidente Dilma no ano passado. "O veto ocorreu por causa da pressão da bancada evangélica, mas eu espero que os políticos parem com essa hipocrisia de negar que o problema da homofobia existe e tomem uma providência logo", declarou o adolescente ao destacar que a população LGBT precisa ter seus direitos respeitados.
Dois meses depois de ser agredido com chutes e pontapés pelo colega de aula, o adolescente disse que enviou o e-mail como uma forma desesperada de romper com o silêncio comum às vítimas da homofobia em busca de respeito. C.T. e sua mãe, que preferiu não divulgar o nome para preservar o filho, receberam o Terra em sua casa, na cidade de Santo Ângelo, localizada a 450 km de Porto Alegre. Pedagoga, a mãe disse que ela e o marido levaram um choque quando souberam que o adolescente havia sido agredido na escola.
"Foi um grande susto, mas desde o primeiro momento decidimos apoiar o nosso filho", contou a mulher ao afirmar que não sabia que o adolescente sofria bullying dos colegas. "A parte física não foi tão forte, foram alguns chutes e socos. Isso passou. Mas o pior foi o lado emocional. Ele tem pesadelos quase todas as noites e agora precisa de acompanhamento psicológico", disse sobre o único filho.
A família de C.T. registrou um boletim de ocorrência na Polícia Civil após a agressão. O colega de aula, da mesma idade, foi ouvido, assim como educadores da escola, que foram acusados de omissão. "Os professores sabiam o que acontecia comigo e tapavam os olhos. Vários colegas faziam piadinha comigo e eles não faziam nada", disse o estudante. "Normalmente, os professores não querem se envolver, não pensam que é algo sério. Acham que é só uma brincadeira de adolescente. Mas no meu caso, o resultado dessas 'brincadeiras' foi a agressão. O meu colega começou a me bater na saída da aula e disse que tinha uma faca para me matar. Tinha um monte de gente em volta olhando, e ninguém fez nada".Segundo a responsável pela Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente de Santo Ângelo, Elaine Maria da Silva, a investigação foi concluída em abril e encaminhada ao Ministério Público. A delegada disse que o resultado não pode ser divulgado por envolver menores de idade. Para C.T., a sensação é de impunidade: "Todo mundo sabe quem eu sou nessa cidade, apesar de ter pessoas que me apoiam, muita gente passa por mim e me reprova. A minha vida mudou muito, tenho medo de sair na rua e ser agredido de novo. Para ele (o agressor), a vida continua a mesma, ou até melhor porque ele foi tratado como herói. Uma prova disso é que semanas depois da agressão ele foi eleito líder da turma", lamenta o adolescente, que estudava no 1º ano do ensino médio na Escola Estadual Onofre Pires.Além do medo, ele precisou enfrentar várias mudanças após denunciar a agressão. A família o matriculou em uma escola particular da cidade. Ele também recebe acompanhamento de duas psicólogas: uma do novo colégio e outra contratada pela Secretaria de Educação do Estado. Apesar do sofrimento, C.T. não se arrepende em ter tornado pública sua história. "Fiz isso como uma garantia para que meu caso não fosse negligenciado".
A direção da escola Onofre Pires, onde ocorreu a agressão, disse que o caso está sob responsabilidade do Ministério Público e que não vai comentar as denúncias do aluno. Já a Secretaria Estadual da Educação informou que presta toda a assistência ao jovem e a sua família, com o acompanhamento da psicóloga.
A atitude desse menino é uma exceção, diz pesquisadora
Coordenadora da Área de Juventude e Políticas Públicas da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais, Miriam Abramovay afirma que a história de C.T. é uma exceção no Brasil. "Ele é uma exceção porque reagiu. Foi para os jornais, falou com os governos, com os movimentos sociais. Isso tudo é fruto de uma consciência política muito forte. A maioria dos adolescentes que passa pela mesma situação acaba silenciando. O medo e a vergonha de se sentir culpado por ser diferente faz com que não reajam à violência", explica Abramovay, autora de diversos livros e pesquisadora sobre a violência nas escolas.Segundo ela, a falta de reação contra o bullying homofóbico causa diversos danos, como o isolamento social, falta de interesse nos estudos e, em alguns casos mais extremos, leva até ao suicídio. "A escola trabalha na lei do silêncio, e não do diálogo. Quanto menos tiver que fazer melhor. Acontecem 800 casos iguais por dia, mas a escola finge que não é nada sério", lamenta a especialista. Ela afirma ainda que os educadores estão despreparados para lidar com a sexualidade e diversidade de gênero e que a falta de uma política pública voltada para discutir a homofobia dentro das escolas impede avanços. "Temos que colocar mais energia nisso. Já existem algumas ações isoladas, mas ainda é algo muito tímido, que precisa ser reforçado", afirma ao destacar a importância da capacitação dos professores para lidar com a violência homofóbica.Para C.T., que sonha em ir para uma cidade maior estudar medicina ou jornalismo, as escolas públicas ainda não estão preparadas para lidar com a homofobia. "Na minha escola nova, que é particular, eu percebo que os professores são mais capacitados, não tem tanto preconceito. Mas no geral, acho que falta muita informação. Eu acredito muito que o preconceito acaba quando as pessoas conhecem o assunto. Elas deixam de acreditar em crendices, passam a perceber que os gays são pessoas iguais a todas as outras", disse ao Terra.
C.T. finalizou citando o kit de combate a homofobia que seria distribuído nas escolas públicas e que foi vetado pela presidente Dilma no ano passado. "O veto ocorreu por causa da pressão da bancada evangélica, mas eu espero que os políticos parem com essa hipocrisia de negar que o problema da homofobia existe e tomem uma providência logo", declarou o adolescente ao destacar que a população LGBT precisa ter seus direitos respeitados.
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