segunda-feira, 13 de novembro de 2017

Aos 95 anos, Bibi Ferreira dá o máximo em show em que passeia por toda a vida

Já perto do fim do show retrospectivo Por toda a minha vida – La dernière tournée, estreado por Bibi Ferreira na cidade natal do Rio de Janeiro (RJ) na noite de ontem, 11 de novembro de 2017, um texto dito pelo mestre de cerimônias do espetáculo, Nilson Raman, enfatizou o apego da atriz e cantora carioca ao palco.

No palco, prega o texto, Bibi se sente inatingível e dá à plateia o máximo do talento ímpar. De fato, para o público que foi ao Teatro Oi Casa Grande ver a estreia nacional deste que está sendo anunciado como o último show da intérprete de atuais 95 anos, Bibi deu o máximo. Mesmo externando o desconforto no palco em que apareceu sentada em cadeira posicionada à frente da orquestra regida pelo maestro Flavio Mendes, por conta de frio ("Tem uma ventania no palco. Cantar com frio não dá"), Bibi deu show, fazendo o melhor que podia. E, quando se trata de uma das intérpretes mais talentosas e versáteis do mundo, a medida do talento, das possibilidades e da entrega é sempre superlativa e mesmo inalcançável. Com título extraído de verso de Eu sei que vou te amar (Antonio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes, 1959), última música do roteiro, cantada antes do bis com sucessos do repertório da cantora francesa Edith Piaf (1915 – 1963), o show Por toda a minha vida faz passeio no tempo pela vida e obra de uma intérprete que transitou pelos palcos, pelos sets de cinema, pelos estúdios de TV e pelo mundo do disco com rigor exemplar. Textos biográficos lidos por Nilson Raman são pretextos para diálogos do diretor musical e arranjador desse show de atmosfera clássica, Flavio Mendes, com Bibi. Ao conversar com a intérprete, Mendes puxa pela memória da artista. E, pelo fio da memória e pelo fio da voz inigualável que resta, Bibi acionou correntes de emoção na estreia quando cantou refinados sambas-canção como Foi a noite (Antonio Carlos Jobim e Newton Mendonça, 1956) e Nossos momentos (Haroldo Barbosa e Luís Reis, 1960), este apresentado no roteiro em medley com Meiga presença (Otávio de Moraes e Paulo Valdez, 1966) para rememorar o fato de Bibi ter dirigido em 1971 um bem-sucedido show da cantora Elizeth Cardoso (1920 – 1990). "Elizeth era uma grande senhora. Essa é que a verdade", ressaltou Bibi, no número.
Além de cantar, Bibi conta detalhes dos encontros artísticos que teve ao longo da carreira iniciada de forma profissional em novembro de 1928. E, quando Bibi canta, vê-se muitas vezes no show a precisão da intérprete. Apelo (Baden Powell e Vinicius de Moraes, 1966), por exemplo, foi feito na estreia nacional do show com a emoção exata. Bibi expôs todo o sentimento contido na letra sem resvalar no (melo)drama. Mas soube ser dramática quando isso lhe foi exigido. A récita de trecho de texto do segundo ato da peça Gota d'água (1975), marco na carreira teatral da atriz, provocou arrepios e aplausos entusiásticos na plateia, tanto pela força da intérprete, quanto pelo apelo de músicas de Chico Buarque como Basta um dia (1975) e Gota d'água (1975). Quase 40 anos antes de fazer história no teatro brasileiro na pele de Joana, protagonista da tragédia de Chico Buarque e Paulo Pontes (1940 – 1976), Bibi estreou no cinema nacional no filme Cidade mulher (1936). Da trilha sonora desse filme, Bibi rememorou Na Bahia (Noel Rosa e José Maria de Abreu), samba pouco conhecido que somente em 1983 ganhou o primeiro registro fonográfico.
Sim, Bibi também é do samba. Mesmo tendo se atrapalhado com a cadência de Palpite infeliz (Noel Rosa e Vadico, 1934), ninguém duvidou da versatilidade e do apurado senso rítmico dessa intérprete que, no roteiro eclético do show Por toda minha vida, canta em alemão (Weigenlied: guten abend, gute nacht, Johannes Brahms, 1968), em espanhol (La verbena de la Paloma, opereta de Tomás Bretón e Ricardo de la Vega, 1894) e até em russo (Oche chornyje, tema do folclore russo), além do francês de Piaf, do português do compositor baiano Dorival Caymmi (1914 – 2008) – celebrado com medley que entrelaça O vento (1953) com A lenda do Abaeté (1948) e que sucede história saborosa sobre a cidadania baiana de Bibi – e do inglês, idioma dominante no teatro musical, gênero do qual Bibi é uma das pioneiras no teatro brasileiro. Em inglês, Bibi canta Oh, you nasty man (Scandals) (Rat Henderson, Irving Ceasar e Jack Yellen, 1934), O Homem de la Mancha (Man of the la Mancha) (Joe Darion e Mitch Leigh, 1965, em versão de Chico Buarque e Ruy Guerra, 1972), Alô, Dolly! (Hello, Dolly!) (Jerry Herman, 1964, em versão de Haroldo Barbosa e Victor Berbara, 1965) e Eu dançava assim (I could have danced all night) (Alan Jay Lerner e Frederick Loewe, 1956, em versão de Victor Berbara, 1963).
Enfim, são velhas canções e velhas histórias que, reunidas no roteiro do show Por toda a minha vida, dão ideia da grandiosidade do talento e da carreira de Bibi Ferreira. Aos 95 anos, Bibi Ferreira ainda é o espetáculo quando, inatingível na glória, pisa no palco sagrado. (Cotação: * * * *) (Créditos das imagens: Bibi Ferreira na estreia do show Por toda a minha vida – La derniér tournée, em 11 de novembro de 2017, no Teatro Oi Casa Grande na cidade do Rio de Janeiro)

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