Era o cantor de Forever and ever, o companheiro de banda de Vangelis nos Aphrodite’s Child e uma das vozes (e rostos) mais populares do rock europeu da década de 1970. O cantor Demis Roussos morreu na madrugada deste domingo no hospital Hygeia, em Atenas. Tinha 68 anos. A notícia foi avançada no Twitter por Nikos Aliagas, jornalista da francesa TF1, e confirmada pela filha do cantor ao Le Figaro. Roussos estaria há algum tempo a receber tratamento para uma doença não especificada.
Nascido Artemios Ventouris Roussos em 1946, em Alexandria, no Egipto, filho de pais de origem grega, Demis Roussos regressaria à Grécia em 1961, depois de a família ter perdido os seus bens na crise do Canal do Suez. Obrigado a trabalhar para apoiar a família, conjugava os estudos, durante o dia, com as actuações nos clubes jazz de Atenas, onde tocava trompete.
Dois anos depois, tinha a sua primeira banda, os The Idols.
Seriam um grupo de versões sem história, excepto num pormenor: foi com eles que se ouviu pela primeira vez a voz de tenor que tanto furor faria na década seguinte. Inicialmente guitarrista e baixista, Roussos aproveitou uma rara oportunidade concedida pelo vocalista dos Idols para interpretar House of the rising sun e When a man loves a woman e ficou certo de que os anos passados no coro da Igreja Ortodoxa Grega de Alexandria não haviam sido em vão.
Em 1966, dá-se o primeiro momento decisivo na sua carreira. É no Verão desse ano que conhece Vangelis Papathanassiou. Em 1968 formam os Aphrodite’s Child com o baterista Lukas Sideras e, sonhando com uma carreira internacional, viajam até Inglaterra. Retidos na fronteira por falta de visto de trabalho, acabam em Paris, no auge do Maio de 68. Rain and tears, o primeiro single, chegou ao topo das tabelas francesas e foi o ponto de partida para uma carreira que fez da banda, com Demis Roussos como baixista e vocalista, um dos nomes pioneiros do rock progressivo. 666, o último registo do trio, álbum conceptual inspirado no Livro das Revelações, fica para a História como um clássico do rock progressivo. O que se seguiu, a ascensão de Demis Roussos ao estatuto de estrela planetária, fez-se porém em terrenos musicais substancialmente diferentes.
666 foi editado em 1972, quando a banda já se separara para que Vangelis e Demis Roussos seguissem percursos a solo. We shall dance, o primeiro single de Roussos, editado em 1971, foi a antecâmara para o sucesso maciço de Forever and ever ou Goodbye my love, goodbye.
Nos anos 1970 a sua voz, a sua barba, as túnicas coloridas e as lantejoulas cobrindo o corpo que, em 1980, atingiria os 147 quilos, formaram uma das imagens icónicas da década.
Demis Roussos era o baladeiro kitsch, o músico que aplicava à pop açucarada algo das músicas mediterrânicas com que crescera. Era também o poliglota (falava sete línguas) que gravava os seus singles em inglês, francês, espanhol, alemão ou português do Brasil (Você você e nada mais, de 1977). Afirmava-se, acima de tudo, como grande estrela pop europeia. “Em 1975 tive cinco álbuns no top 10 [no Reino Unido]. Ganhei o prémio de melhor artista masculino, melhor single e melhor álbum. Eu e os ABBA ganhámos tudo”, recordava em 1999 ao Guardian.
Continuando a colaborar esporadicamente com Vangelis (na banda-sonora de Blade Runner – Perigo Iminente ou na versão cantada de Momentos de Glória, editada em 1981 sob o título Race to the End), prosseguiu a carreira a solo com edições regulares e com digressões constantes. À medida que o sucesso das novas edições se ia esbatendo, a sua música foi ganhando novas características, aproximando-se do new age, recorrendo à electrónica e exibindo mais declaradamente influências gregas, balcânicas ou árabes.
O amor, naturalmente, continuava a ser o tema principal. Mas outro tipo de amor: “Continuo a cantar canções de amor, mas já não têm as letras simples e directas que cantava nos anos 1970. Abordam o amor de uma forma mais ampla, ao contrário do ‘vou oferecer-te uma flor, és a minha bela senhora”. Ainda assim, nunca se cansava dos velhos êxitos. “Vejo todas as minhas canções como filhos e acho que um pai nunca se cansa dos seus filhos, caso contrário não será um bom pai”, argumentava ao Guardian.
Demis, de 2009, foi o seu último álbum. Nesse mesmo ano, festejou os 40 anos de carreira com um concerto em Atenas, descrito como “gigantesco” no obituário da TF1. O facto de ter sido durante o percurso a solo alvo constante da crítica, que lhe desvalorizava os feitos comerciais e desdenhava dos méritos artísticos, era-lhe indiferente. Sabia que as suas canções tinham chegado a milhões de pessoas e isso era mais que suficiente. “Ninguém pode negar que o meu nome deixou uma marca na música do século [XX]”, afirmava em 1999. “Mesmo que morra amanhã, Demis Roussos deixou uma carta, uma marca, algo que não pode ser esquecido”.
Ao longo da carreira terá vendido cerca de 60 milhões de álbuns. Bem-humorado, comentava da seguinte forma à Paris Match o seu sucesso, no ano da celebração dos 40 anos de carreira: “Já vendi milhões desta porcaria… Não me arrependo de nada. Sempre soube adaptar-me, fazendo com que a tua mãe adore [a música] mesmo quando lhe junto sons rock”.
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