O baixista e vocalista Tom Araya durante o show da banda de thrash norte-americana no Via Funchal
Foto: Ricardo Matsukawa/Terra
Foto: Ricardo Matsukawa/Terra
O clima severo que castigou a cidade de São Paulo na tarde desta quinta-feira (9), com ventos fortes, chuva e muito frio, parecia um presságio para o que estava por vir no Via Funchal horas depois. O Slayer, banda fundadora do estilo thrash metal, voltou à cidade após cinco anos e lotou a casa de shows com uma apresentação sombria e enérgica, emendando uma canção na outra, fazendo com que o público mal tivesse tempo para respirar. E o melhor, sem pista premium, prática que se tornou regra nos últimos anos na cidade, dando à noite ares de um verdadeiro show de rock, sem separar os mais dos menos endinheirados.
A excelente iluminação, um misto de luzes vermelhas, azuis e laranjas, e o repertório de 22 músicas, uma pedrada após a outra, fizeram do evento um espetáculo, demonstrando o por quê de o quarteto manter até hoje a fama de ter uma das melhores performances ao vivo do estilo. Parte da turnê mundial do disco World Painted Blood, que desde fevereiro tem o guitarrista Gary Holt, do Exodus, substituindo Jeff Hanneman por conta de uma doença contraída por ele após ter sido picado por uma aranha, o grupo subiu ao palco pontualmente às 22h, trazendo os presentes à baixo com a faixa que dá nome ao giro atual. Logo começaram a se abrir as rodas de mosh e os fãs, em sua maioria com idade superior aos 25 anos, tiveram a oportunidade de se sentir de volta à adolescência, ao menos durante as pouco menos de duas horas de apresentação. O fato de os paulistanos cantarem em uníssono o refrão da faixa inicial, o que se repetiu na música seguinte, Hate Worldwide, também do último álbum do conjunto, deixou patente sua fidelidade por acompanhar mesmo os mais recentes lançamentos do quarteto, cuja carreira completa três décadas em 2011. Sob gritos de "Slayer, Slayer", o sempre sorridente vocalista e baixista Tom Araya proferiu na sequência uma de suas poucas frases na apresentação: "muito obrigado por vocês virem esta noite. Vocês estão prontos?", indagou antes de anunciar War Ensemble, grande clássico do álbum Season in the Abyss, lançado em 1990. O pedal duplo e as guitarras eram ensurdecedores, mas surpreendentemente bem limpos sonoricamente, padrão de qualidade mantido durante todo o show. No entanto, ao final da canção, eis que as caixas de som de todo o palco ficaram completamente mudas, problema técnico que teve como consequência brados da plateia xingando a casa que recebia o evento - "ei, Funchal, vai tomar no ..!". Ainda assim, surpreendentemente, a banda, mesmo sem som, completou a música, entoada pelos fãs acompanhados apenas pelo som da bateria "desplugada".
O problema, mais tarde justificado no telão do Via Funchal como de total responsabilidade da equipe do Slayer, levou a banda a deixar o palco por cerca de quatro minutos, momento em que seus integrantes puderam escutar a empolgação e expectativa do público com a maior parte do show que ainda estava por vir.
Postmorten, do disco Reing in Blood, deu continuidade ao set-list, seguida por Temptation e Dittohead. "Eu quero agradecer a compreensão de todos vocês com o que ocorreu há pouco", disse Araya antes de anunciar Stain of Mind, do Diabolus in Musica, álbum mais moderno e alternativo do conjunto, de 1998.
A velocidade, o peso, o fato de uma música ser emendada atrás da outra e a incrível disposição de seus integrantes tornam o show do Slayer único. Kerry King, cujo gigantesco cavanhaque parece uma forma de compensar a calvície adquirida com o passar dos anos, bate cabeça sem parar, move os lábios cantando as letras das músicas e, entre uma passeada de um lado a outro do palco, confere a admiração que os fãs nutrem por ele. Dave Lombardo é um baterista extraordinário e seu bumbo preciso chega a ser ensurdecedor. Dono de uma voz potente, Tom Araya tem um enorme carisma, sempre com um largo sorriso no rosto, que, aliado à sombria iluminação do palco, por diversas vezes o faz parecer encarnar um demônio sarcástico. E Gary Holt, cumprindo a árdua tarefa de substituir um dos fundadores da banda, não fez feio e conseguiu levantar o público com seus solos e o constante uso da alavanca em seu instrumento.
"Essa próxima música é sobre liberdade. Todos têm um preço e esse preço é vencer", disse o frontman antes da execução de Americon, do disco World Painted Blood. A banda seguiu com Payback, Suicide Mandatory, Chemical Warfare e Season in the Abyss, faixa com pegada mais tradicional cantada por todos os presentes.
Contudo, o grande momento do show ainda estava por vir. Depois de deixar o palco, o quarteto retornou para o bis com quatro de seus maiores clássicos, faixas pesadas que deixaram visível a agitação do público, tão inquieto que muitas vezes se assemelhava a um grande mar repleto de ondas: South of Heaven, Raining Blood, Black Magic e, para encerrar, Angel of Death, seguida por enorme ovação e cantos de "olê, olê, ola, Slayer, Slayer". "Obrigado, muito obrigado", disse Araya em português, "quero agradecer a Gary Holt por se juntar a nós. Muchicimas gracias, thank you very much". Marcante, cru, pesado. Vai deixar saudades.
Set-list:
World Painted Blood
Hate Worldwide
War Ensemble
Postmortem
Temptation
Dittohead
Stain of Mind
Disciple
Blood Rain
Dead Skin Mask
Hallowed Point
The Antichrist
Americon
Payback
Suicide Mandatory
Chemical Warfare
Season in the Abyss
Snuff
Encore:
South of Heaven
Raining Blood
Black Magic
Nenhum comentário:
Postar um comentário