sábado, 17 de setembro de 2011

'Glee 3D - O Filme' exalta o "loser" e derrapa na pieguice

'Glee 3D - O Filme' estreia nesta sexta-feira (16) nos cinemas. Foto: Divulgação 'Glee 3D - O Filme' estreia nesta sexta-feira (16) nos cinemas
Foto: Divulgação
Gabriel Perline
 
É com grande ar de sentimentalismo que Glee 3D - O Filme chegou às salas de cinemas do Brasil nesta sexta-feira (16). Os fãs que não tiveram a oportunidade - leia-se condições - de ver o elenco da série americana se apresentar na turnê, que rodou os Estados Unidos e Europa, poderão ficar um pouco mais próximos de seus ídolos, ainda que de forma virtual, e satisfazer a curiosidade de ver a performance dos cantores/atores em palco. Embora a série retrate o universo dos "excluídos", ela ainda possui caráter elitista no Brasil, pois somente aqueles que assinam TV a cabo - ou os que recorrem a métodos ilegais (download pirata) - conseguem acompanhar a trama, que só em julho deste ano ganhou espaço em nossa TV aberta. Mas a legião que cultua Rachel, Finn, Kurt e companhia limitada ganha cada vez mais adeptos por aqui, o que justifica a exibição do show/documentário em nossos cinemas. O material, apesar de divulgado como documentário dos bastidores da turnê Glee Live! In Concert!, trata-se de uma compilação de pequenos vídeos com declarações cômicas dos atores - incorporados por seus personagens -, mesclado com a apresentação do grupo em 23 músicas no palco do IZOD Center, em Nova Jersey (EUA), e relatos dos "losers" da vida real, que são fãs da série e se fizeram valer dos dramas desta ficção para se aceitarem e encontrarem seus lugares no mundo. O fênomeno mundial em que Glee se transformou é explicitado no vídeo. A vibração dos anônimos exibidos na telona, somado aos exageros cometidos pelos mais fanáticos - que fizeram cosplay dos personagens na plateia do show -, são provas de que a série motivou as minorias a se assumirem e ganharem espaço nos grupos em que fazem parte. Aliás, é nisso que o filme se apoia: justificar o sucesso da trama e o trabalho social que promoveu na vida daqueles que encontram um pouco de si nas aflições dos humilhados na TV.
Losers no palco
O brilho nos olhos dos fãs, somado aos hits que fizeram sucesso na trama, formaram o casamento perfeito para a enérgica apresentação exibida no cinema. Don't Stop Believin', que se tornou hino de Glee, é usada no pontapé inicial do show. Lea Michele e Cory Monteith, intérpretes de Rachel e Finn, soltaram as vozes sem ajuda de playback, recurso muito utilizado pelos demais integrantes do grupo em outras canções.
O setlist do espetáculo é bastante variado, contando com músicas de artistas consagrados, como I Wanna Hold Your Hand (Beatles), Somebody To Love (Queen) e River Deep, Mountain High (Tina Turner), e privilegiando sucessos do pop atual, como Firework (Katy Perry), Born This Way (Lady Gaga) e Empire State of Mind (Alicia Keys). A performance dos atores/cantores é impecável. Eles cantam, dançam, pulam, correm pelo palco e ainda mantêm sorriso no rosto do começo ao fim do show, mantendo a histeria em alta até o acender das luzes do ginásio em que o espetáculo foi gravado. Os pontos altos são os vocais de Rachel (Lea Michele) e Mercedes (Amber Riley), a participação de Gwyneth Paltrow - na pele da professora Holly Holliday -, a discreta homenagem a Amy Winehouse com a performance de Valerie, o número rebolativo de Brittany (Heather Morris) em I'm Slave 4 U e a intervenção do grupo The Warblers, liderado por Blaine (Darren Criss). Mas perde pontos por não trazer dois ícones da série, Will Schuester (Matthew Morrison) e Sue Sylvester (Jane Lynch), além de tornar ainda mais coadjuvantes Quinn (Dianna Agron), Sam (Chord Overstreet) e Tina (Jenna Ushkowitz), que tiveram participações tímidas no espetáculo, na maioria das vezes como vozes de apoio aos demais personagens.
Sentimentalismo exagerado
A parte documental do filme se apoia, em sua maioria, nos dramas de pessoas que encontraram na série a chave para o convívio social. Tem o relato de um menino gay, que se apaixonou por um colega da escola e teve sua orientação sexual divulgada quando lhe roubaram o diário; uma estudante anã, que faz parte do grupo de líderes de torcida da escola e vence o concurso de rainha do baile de formatura; e uma jovem obesa, portadora de uma rara doença, que a impede de conviver em público pacificamente.
Todas as histórias, minuciosamente detalhadas no vídeo, causam certa comoção, mas se tornam apelativas de acordo com os discursos dos personagens, que se repetiam constantemente: "Glee mudou a minha vida". Pelos relatos, a série ganha status de remédio milagroso, capaz de curar qualquer problema de auto aceitação e posicionamento social. A mensagem que fica no ar é: "Glee mudará sua vida".
Além disso, quem vai ao cinema na expectativa de ver depoimentos dos atores, pode acabar decepcionado, pois encontrará, no máximo, os personagens fazendo breves piadas sobre o cotidiano da série. A aproximação dos artistas que o efeito 3D tenta aplicar durante o show é rapidamente anulada ao ver os astros em situações fakes, distanciando qualquer contato dos fãs com o "mundo real" de seus ídolos. Nestes momentos, o sentimentalismo é zero.
Falhas técnicas
O efeito 3D está para o cinema assim como a calça boca de sino está para o universo da moda, ou seja, desgastado. Poderia ser completamente descartado deste material, uma vez que sua aplicação não reproduz o real efeito que deveria. Colocar o artista dentro da sala do cinema é um bom atrativo para o público, mas o recurso não é usado de forma adequada. Em determinados momentos do show, os cantores "invadem" a sessão, mas o close da câmera em seus rostos projeta somente a parte focada do artista. Ou seja, metade do corpo adentra a escuridão, porém suas pernas e topo da cabeça permanecem no palco, promovendo uma certa "desmontagem" do personagem. Outra problema do vídeo é a mescla de dublagem com legendas. As cenas de entrevistas nos bastidores com os personagens e os documentários ganharam vozes brasileiras, que não se encaixam nos artistas. Qualquer leigo em Glee, ao ouvir o elenco cantar, percebe que as vozes destoam das reais, apresentadas na parte musical. As legendas são utilizadas durante o show. Nos momentos de interação com os fãs, os discursos dos cantores recebem subtítulos, assim como todas as músicas interpretadas. A indefinição quanto ao recurso empobrece o material, que é salvo somente pela atuação dos artistas, responsáveis por minimizar o leve amadorismo notado na parte técnica.

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